21 de jun. de 2015

UFMG lança Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas

                             CLÍNICA DE TRABALHO ESCRAVO E TRÁFICO DE PESSOAS

 

 

Manifesto contra o retorno à escravidão: 

Abaixo o PLS 432/13 e o PL 3.842/12

As entidades e as pessoas abaixo relacionadas vêm a público manifestar sua firme oposição ao Projeto de Lei do Senado nº 432/2013 e ao Projeto de Lei da Câmara nº 3.842/2012, que alteram o artigo 149 do Código Penal para excluir a jornada exaustiva e as condições degradantes do tipo penal que condena o trabalho em condições análogas às de escravo.

Os projetos tratam da regulamentação da expropriação das glebas em que for utilizada mão-de-obra em condições análogas às de escravo, inserida no artigo 243 da Constituição da República pela Emenda Constitucional nº 81/14. No entanto, esvaziam o conteúdo do artigo 149 (CP), ocasionando verdadeiro retrocesso na proteção ao trabalhador. 

Atualmente, prevê o Código Penal que o crime de redução à condição análoga à de escravo abrange a submissão a trabalhos forçados e/ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. Também incorre na mesma pena de reclusão de dois a oito anos quem cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador e quem mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

A aprovação do PLS nº 432/13 e/ou do PL nº 3.842/12restringe o tipo penal, de forma a ser considerado como trabalho em condições análogas às de escravo apenas aquele em que há: a submissão a trabalho forçado, exigido sob ameaça de punição, com uso de coação ou com restrição da liberdade pessoal; o cerceamento do uso de meio de transporte para reter o trabalhador no local de trabalho; a vigilância ostensiva e apropriação de seus documentos e a restrição de sua locomoção em razão de dívida.

A retirada da jornada exaustiva e do trabalho em condições degradantes do tipo penal brasileiro representa retrocesso na proteção de direitos historicamente conquistados. O conceito atual é considerado pela Organização Internacional do Trabalho como marco internacional a ser seguido pelos demais países, colocando o Brasil à frente no combate à escravidão moderna. 

Foi a partir desse conceito de trabalho escravo contemporâneo que o Ministério do Trabalho e Emprego realizou mais de 1500 operações de resgate nos últimos 20 anos, resultando em mais de 80 milhões de reais em indenizações e mais de 40.000 trabalhadores resgatadosForçoso destacar ainda que mais de 80% das autuações se deu em razão da verificação da submissão do trabalhador a condições degradantes de trabalho e/ou à jornada exaustiva. 

Ao contrário do que se propaga, o conceito de jornada exaustiva e o de condições degradantes são bem sedimentados na doutrina e na jurisprudência. Há inclusive diversas normativas dos órgãos responsáveis pela fiscalização e pelo combate da prática conceituando de forma expressa e clara as figuras penais em análise. 

Como jornada exaustiva, podemos entender a submissão do trabalhador a um esforço excessivo e frequentecom sobrecarga de trabalho, ficando este sem tempo suficiente para a recuperação física, resultando em possíveis danos à sua saúde ou, até mesmo, em risco de morte. Na caracterização do trabalho escravo por jornada exaustiva, o que está em jogo é a proteção integral à saúde, garantindo o descanso e permitindo o convívio social. Como exemplo dessa caracterização estão os casos decortadores de cana de açúcar que faleceram por exaustão devido à jornada intensa a que eram submetidos.

Da mesma forma, as condições degradantes são conceituadas de forma simples, consideradas no caso em que o empregador sujeita o trabalhador cumprir suas atividades com alimentação, trabalho, saúde e segurança desumanas, que afetam sua dignidade. 

Por isso, é imperioso protestar contra os projetos de lei que querem ferir o conceito atual e corretíssimo do artigo 149 do Código Penal, proclamado internacionalmente como o mais avançado do mundo, com o objetivo exclusivo de evitar as condenações recorrentes a que vêm sendo submetidas as empresas que dele se utilizam.

Pedimos, portanto, sua assinatura, manifestando posição contrária às aprovações.

Belo Horizonte27 de maio de 2015.

Clínica de Trabalho escravo e tráfico de pessoas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais 

 

COORDENAÇÃO: CARLOS HENRIQUE BORLIDO HADDAD e LÍVIA MENDES MOREIRA MIRAGLIA 

ASSISTÊNCIA JURÍDICA: LÍLIA CARVALHO FINELLI, ISABELA MURTA DE ÁVILA, ADRIANA LETÍCIA SARAIVA LAMOUNIER RODRIGUES

PESQUISADORAS: THAIS CORRÊA, THAIS MORAIS, PATRÍCIA RÜCK, VICTORIA SOARES, BÁRBARA NOGUEIRA, ANA CAROLINA OLIVEIRA, RAYHANNA FERNANDES http://www.clinicatrabalhoescravo.com  Livia Mendes M. Miraglia

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